Fale-nos da sua última colecção Outono/Inverno 2010-2011? Quais foram as suas fontes de inspiração para a colecção e para o desfile?
Tanto esta colecção como a própria concepção do desfile foram inspirados na fusão entre o Oriente e África, fusão essa que se vai poder ver nos materiais utilizados, nas cores, nos detalhes como o uso das penas nos penteados, a até na própria música. Vai ser uma colecção de Inverno onde as sedas se misturam com as lãs e as peles havendo sempre uma conjugação de materiais muito perfeita ou aquilo que eu gostaria que fosse perfeita. É uma colecção que transmite muita paz, muita tranquilidade mas ao mesmo tempo é uma colecção que nos leva a sítios longínquos inesquecíveis. Penso que é uma colecção que as pessoas vão gostar pelas cores, pelo corte, e pela emoção que toda ela nos transmite. Não foi fácil misturar duas culturas tão vincadas como a africana e a oriental e tornar essa fusão harmoniosa, designadamente, a ostentação do Oriente e a paz de espírito e tranquilidade de África.
Eu penso que todas as colecções têm que ter o seu lado ostentoso mas o exagero a mim incomoda-me de certa forma. É claro que nos desfiles há que haver um lado de espectáculo e brilho para tornar as colecções vincadas. Mas até mesmo na própria passerelle gosto que tudo seja muito harmonioso sempre com muita atenção aos pormenores. Uma certa discrição mesmo no luxo é aquilo que me define, o ar chique e ao mesmo tempo austero.
Que tipo de mulher é que o Carlos Gil gosta de vestir?
Gosto de vestir a mulher que trabalha com uma personalidade muito vincada, forte e que sinta em si vontade e necessidade de se afirmar. É óbvio que a imagem hoje em dia é talvez das coisas mais importantes mas não podemos levar isso ao extremo, devemos sempre conjugar a imagem com a personalidade, nunca desfigurando aquilo que a pessoa é mas ajudando-a a sublinhar os pontos fortes a transmitir sofisticação.
Quando está a criar uma colecção o que é que para si é mais importante a moda ou o estilo?
Estilo, sem sombra de dúvida. Até porque a moda é algo muito passageiro. O estilo de uma pessoa é algo muito forte e muito próprio e que se tem ou não se tem. Não é um estilista que cria estilo e classe a uma pessoa, é a imagem de uma pessoa que acrescenta estilo àquilo que veste. É a mulher que pode enaltecer o vestido não é o vestido que vai dizer que aquela mulher está deslumbrante. São essas mulheres que eu gosto de vestir. Como uma Priscilla Presley ou uma Vicky Fernandes e Yolanda. São mulheres que acrescentam carisma e classe a qualquer peça que usem.
Como é que mede a temperatura da moda portuguesa?
É difícil falar porque hoje em dia nós estamos limitados em muitos pontos, mas, penso que a moda em Portugal está no bom caminho pelo menos temos boas perspectivas, mas, ainda há um longo caminho a percorrer para sermos um centro de moda. Mas acho que todos nós temos um bom sapato e um bom pé que entre nesse sapato para caminhar.
Apesar da grande tradição portuguesa nos têxteis e sapatos com qualidade há muito reconhecida, o que é que falta para que os nossos criadores se imponham no mercado externo?
Eu penso que antes de se partir para o mercado externo temos que conquistar o mercado interno. Por vezes o que falta em Portugal é a união. Se cada um puxar só para si não se consegue nada, a união pelo contrário gera uma grande força e leva a grandes feitos. Penso que quando isso for feito, primeiro internamente e depois externamente será tudo muito mais fácil.
Quando se refere a união está a falar dos criadores?
Estou a falar dos criadores, de produtores, de tudo aquilo que envolve a moda. As pessoas às vezes julgam que a moda é o estilista mas não é. Há uma grande equipa que está por detrás do estilista: o maquilhador, o cabeleireiro, um bom Dj, quem trabalhe a passerelle, alguém que assegure a parte financeira, os produtores, os organizadores dos eventos, todos têm que estar muito unidos nos mesmos objectivos para que se possa fazer um grande espectáculo e é desses grandes espectáculos que eu gosto e para os quais eu vivo.
Como é que vê o facto de as revistas de moda portuguesas ou as edições portuguesas de revistas internacionais usarem tão pouco peças de criadores portugueses nos seus editoriais de moda?
Eu acho que as pessoas gostam do inatingível e acham que tem muito mais valor mostrar uma peça que só está ao alcance de uns quantos eleitos. Mostrar uma peça de Carlos Gil é muito mais fácil do que uma peça da Chanel ou do YSL. Quanto à falta de editoriais de moda portugueses está mais uma vez patente a tal falta de união que falei anteriormente. Mas, toda essa situação vem muito detrás e tudo depende das directrizes da direcção das próprias revistas, ou se apanham as pessoas abertas para esse rumo ou não. Felizmente que hoje já se encontram pessoas com um determinado estatuto que fazem questão de vestir marcas portuguesas. É o caso da nossa Primeira-dama, Maria Cavaco Silva, que prefere vestir peças de um criador português. Ela é o exemplo de princípios de promoção da moda nacional que todos deveriam seguir.
Como é que aconteceu o Carlos Gil vir a ser o responsável pelo guarda-roupa da Primeira-Dama?
Tudo aconteceu de forma muito natural como tudo na minha vida. Eu visto a Kátia Guerreiro e naquele dia vesti-lhe um fato que a Dra. Maria (Cavaco Silva) gostou e perguntou quem é que era o estilista da Kátia. E assim eu apareci em cena.
É um grande desafio vestir a Primeira-dama de Portugal?
Tudo na minha vida é um desafio, a vida é um desafio constante, hoje estar a falar aqui consigo é um desafio, porquê? Porque poderia correr mal. O ter vindo hoje aqui a Aveiro está a ser outro desafio. Vestir a Primeira-dama é um desafio que trás dificuldades acrescidas pelo cargo que ela desempenha, tenho que ser muito perspicaz... Quanto ao estilo não se deve modificar o estilo de uma pessoa mas respeitar-se a sua personalidade e cabe ao estilista fazer desabrochar o estilo pessoal. Tem sido um trabalho e um desafio ao longo destes cinco anos muito interessante e que exige muito esforço mas tenho conseguido alcançar os objectivos que tinha traçado.
Se tivesse que resumir as suas colecções em poucas palavras quais seriam?
A principal é o conforto. Não há nenhuma colecção que eu faça que não tenha que me assegurar se as peças são confortáveis quer pelo toque dos tecidos, pela silhueta, se a peça é vestível… De seguida a elegância porque não pode haver conforto sem elegância e vice-versa. Se a pessoa não se sente bem não pode estar elegante. Depois é o glamour mas com discrição e muita sofisticação, tudo temperado com muita simplicidade chique.
Fotografia de João Lamares (http://www.joaolamares.com/ )
Texto de Paula Lamares para Fashion Heroines
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